Não vou mentir e nem tentar disfarçar. Este relato tem forte influência do blog de Ifemelu. Caso você não saiba do que estou falando, dê um google e vá atrás de descobrir (sim, isso é propositalmente uma dica de leitura).
De qualquer
forma, o que me motiva a fazer esse relato são encontros curiosos com
conhecidos ou não que temos ao longo da vida. Tendemos a ignorar muitos destes
encontros e não nos damos conta de como, mesmo insignificantemente, eles podem
dar graça aos dias.
Sexta-feira.
Eu estava numa grande livraria apenas passando o tempo
para dar o horário da janta que estava marcada.
Carregava
um novo livro e estava muito curiosa para começar a leitura. Por alguns minutos
pensei se valia mais a pena buscar o mesmo livro nas estantes e devolver ao
sair, mantendo o meu em segredo. Afinal, poderia parecer estranho alguém lendo
no meio da livraria e ao sair simplesmente guardar o livro na bolsa. Sabia que
não tinha por que temer os olhares tortos de desconfiança – (in)felizmente tenho
privilégios sobre isso – e, somado à preguiça de buscar pelo livro e/ou
precisar perguntar para algum vendedor, resolvi sentar numa poltrona e tirar
meu próprio da mochila.
Escolhi,
escolhi e escolhi e acabei me sentando num lugar entre dois rapazes que
aparentemente faziam reunião por audio de whatsapp (e um deles deixava o áudio
aberto para que todos ouvissem também). Depois de algumas páginas me cansei do
barulho e procurei outro lugar.
Sentei próxima
a um rapaz que estava concentrado mexendo no celular. Este não vai me atrapalhar.
- Oi,
desculpe... esse livro é bom?
- Na
verdade, não sei ainda. Acabei de começar a leitura, mas estou bastante
interessada.
- Ah,
estou com vontade de ler... Alguns amigos me falaram bem.
Mentira.
Tinha certeza de que ele nem tinha conseguido sequer ver a capa do livro. Não sabia
de qual se tratava.
- Ah, é?
Sim, parece bom. Eu adorei o filme, então fiquei curiosa sobre o livro.
- Ah...
tem filme também?
Comprovação
da mentira. Se ele tivesse qualquer informação sobre o livro, saberia também de
que se tratava de um dos filmes mais comentados do ano, concorrendo a vários
oscars.
- Sim...
você sabe sobre do que se trata?
- Hum...
É... não...
- É uma
história de amor entre um adolescente de 17 anos e um aluno do seu pai, de 24. É um romance. Escrito em primeira pessoa em forma dos pensamentos e memórias do personagem principal.
- Um alunO?
Provavelmente
nesse momento ele percebeu que foi uma péssima ideia ter puxado papo sobre um livro
que supostamente ele estava muito interessado, mas que na verdade não tinha
informação nenhuma a respeito.
Eu queria
cortar o assunto. Tinha mudado de lugar para não ser atrapalhada por barulhos. A
ultima coisa que eu queria era ser interrompida por cantada barata de livraria.
Além do mais, estava realmente muito interessada livro. Mas a educação falou
mais alto.
- Sim, é
uma história de dois rapazes. Mas não sobre preconceitos ou dramas. Sobre amor.
-
Nossa........
- Olha,
o livro parece bom e o filme é muito bom também. Se você está interessado, vá
atrás que vale a pena.
Achei que
tivesse ganhado. Mais dois minutos. Mais uma página.
-
Desculpa.... posso te perguntar uma coisa?
(Não. Não pode. Você não percebeu que está me atrapalhando?)
- Claro
- Estou
namorando uma menina há 1 ano e meio...
E hoje meu plano é pedi-la em casamento
- Sério?
Nossa! Que legal! (ok... por essa eu não
esperava)
- Sim...
Mas tem uma coisa (sempre tem)...
Hoje eu descobri que ela está mentindo pra mim. E agora não sei o que fazer
- Como
assim? (confesso que aqui já era uma
mistura de “me deixa em paz” com “fala logo, que estou curiosa")
Ele
contou uma história que não me lembro de detalhes. Algo sobre um telefonema em
que fez uma pergunta e sentiu que ela estava mentindo. Pareceu tão bobo. Tão bobo
que eu, que odeio mentiras, dei uma resposta que surpreendeu até mesmo a mim. Acho
que fiquei ainda mais irritada por ter sido atrapalhada por algo irrelevante.
-
Olha... todo mundo mente.
-
.......
- As
pessoas mentem todos os dias por mil motivos. Não adianta só você se apegar no
fato de ela estar mentindo. Sobre o que era a mentira? Qual a motivação?
Impacta outras coisas? Foi a primeira vez?
- Não
acho que foi a primeira vez, não sei o tamanho que pode ter e não sei o que
fazer. Pode me dar um conselho? O que eu faço agora? Continuo com meu plano?
Finjo que nada aconteceu? Tento descobrir algo mais?
Quem sou
eu pra dar conselhos? Tenho cara de psicóloga ou vivida?
- Não
posso te dizer o que fazer. Eu nem sei toda a história. Só você pode decidir.
- O que
você faria?
- Eu?
Seria 100% sincera. Cartas na mesa. Perguntaria na lata.
- Mas
isso é meio assustador.
- É
sim... Você pode fingir que nada aconteceu também. É sempre uma saída fácil.
Mas você quer pedir em casamento alguém com quem você não pode ser totalmente
transparente?
- É,
acho que você tem razão.
Telefone
toca. Conversa rápida.
- Ela
chegou. Até mais. Desculpa ter te atrapalhado. Obrigado pela ajuda.
- Não
tem problema... Boa sorte!
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