Ficou

quinta-feira, 27 de setembro de 2012



Do olhar ficaram os cílios, batendo... batendo...
Dos jantares ficaram os pratos.
Das mensagens ficou o celular.
Das conversas ficou o silêncio.
Da expectativa ficou a ilusão.
Das roupas ficou a camiseta.
Dos amigos ficaram colegas.
Do cheiro ficou a lembrança.
Do carro ficaram os bancos.
Das mãos ficaram os anéis.
Do inteiro ficou a metade.
Do cinema ficou a pipoca.
Das músicas ficou o ipod.
Do sexo ficou a vontade.
Do abraço ficou o vazio.
Do sorriso ficou a boca.
Do beijo ficou o gosto.
Do toque ficou o frio.

De você ficou a saudade.
...Ficou.



(i)limitando

segunda-feira, 24 de setembro de 2012



Acho importante cada um saber seus limites. Com relação a tudo.
Saber até onde pode ir, até onde aguenta. O problema é que muitas vezes o único jeito de conhecer o limite é testando.

Em alguns pontos da nossa vida nós não sabemos até onde conseguimos ir, até, de fato, chegarmos lá.
E é aí que me pergunto: será que realmente vale a pena conhecermos todos os limites?
Porque, acredite quando eu digo, o processo de testar a si mesmo até a última gota pode ser muito doloroso e desgastante. E pior: pode ser completamente insatisfatório.

É incrível como não conhecemos bem nem a nós mesmos. E se dar conta de que algum limite é muito menor do que se imaginava é ver a sua fraqueza jogada na sua cara, como um balde de água fria cheia de pedras de gelo e a vida rolando de rir de você - nunca com você.

Os limites existem para evitar que nos machuquemos. A dor é uma forma do nosso próprio organismo demonstrar que chegou no limite.
E se sabemos que a resposta é a dor, por que testá-lo?

O homem é um animal, racional, mas é. Como tal, segue instintos também. Acredito que o maior instinto do ser humano é seu modo de agir quando é desafiado. Nascemos para tal.
Até mesmo nos relacionamentos, quando não há desafio não floresce amor. Faz parte da nossa dança do acasalamento. É o que buscamos para a nossa sobrevivência e reprodução.

Com certeza é esse mesmo desafio que nos impulsiona a testar nossos limites, mesmo sabendo que podemos - e vamos - nos machucar.
Melhor do que ser desafiado é desafiar a si próprio. Vencer suas próprias barreiras, demonstrando que é muito melhor do que si mesmo.

Encontrar um limite indesejado é triste. Mas faz parte do auto-conhecimento e crescimento. E nos ajuda a enxergar onde podemos nos desafiar.
Vale a pena chorar, sentir, ouvir músicas deprês, ficar revoltado por se achar fraco. Vale a pena porque encontra a si mesmo em frente a um espelho, te apontando um grande dedo e dizendo: "Isso é apenas um limite agora. Vai ficar aí parado lamentando? Eu duvido que você encontre algo para mostrar do que é melhor do que isso! Vai!"

Indesejada

domingo, 16 de setembro de 2012


Sai do banho e com a toalha ainda torcida nos cabelos molhados, para.
Passa a mão no espelho a fim de desvendar sua imagem oculta pelas gotas de água formadas pelo vapor.

Solta as toalhas - tanto a dos cabelos, quanto a do corpo. Cabelo muito preto, muito longo, muitos cachos. Olhos muito grandes e igualmente escuros. Pele muito branca, contrastando com tudo, exceto o azulejo da parede.

Presta mais atenção na imagem do que seus grandes olhos podem captar  e repete mentalmente "ele não me deseja".
Procura algo bizarro no seu corpo, algo que possa explicar essa condição. "Ele não me deseja..."

Sente-se egoísta por esse pensamento lhe fazer tão mal. Mas, acima de tudo, sente-se injustiçada. Acha simplesmente injusto o que a vida lhe reserva nesse momento. Que ela o queira com todas as suas forças, em todos os seus átomos, de todas as formas. E ele simplesmente opta por não desejá-la. E fim.
Como quem puxa o band-aid de uma só vez para não sentir.

"Ah, me poupe, Luiza!"
Tanta coisa para fazer, tanto trabalho atrasado, o quarto para arrumar, as roupas para guardar e só o que consegue pensar é "Ele não me deseja".
Parece que repetir essa frase infinitas vezes vai ajudar a aceitar ou mudar a realidade.
Confabula possibilidades. Procura brechas. Cogita apelação, "e se eu aparecer no apartamento dele semi-nua? Talvez ele me deseje novamente... Aquele fogo tem que estar em algum lugar!".
Para. Que pensamento mais baixo. Se quisesse um animal instintivo compraria um cachorro.

Mas, como lidar com a rejeição? Como lidar com o espelho? Como lidar com a auto-estima - ou a falta dela - quando os cachos lhe caem sobre o peito de uma forma que, antes lembrava um penteado sensual, agora mais chega perto de um "despenteado" debochado. Debochando dela. "Ele não te deseja, você não é boa o suficiente".

Luiza, que antes achava que um corpo dentro dos padrões, boas notas e um papo agradável eram suficientes, agora está perdida num mar que é ela mesma.
"Ele não me deseja"
Sem saber por quanto tempo isso irá persegui-la, desiste do banheiro quente e úmido e volta à realidade.
Procura a lingerie mais bonita, a roupa mais confortável, deixa os cabelos secarem naturalmente.
Vai até o supermercado mais próximo e encontra o único que não a deixará sozinha e que preencherá momentaneamente esse vazio da rejeição, do indesejo. Chocolate.
Devora a barra muito mais rápido do que gostaria, voltando a lembrar do motivo muito antes do esperado.
Guarda o papel laminado e cola um adesivo em cima com os dizeres "Ele não te deseja". Para assim, tentar esquecer, ou não deixar de lembrar.

Minhas metades

terça-feira, 4 de setembro de 2012


Eu como meio pão.
Bebo meia latinha de coca.
Uso meia folha sulfite pra deixar um recado.
Durmo meia noite.
Aturo meias palavras.
Dou meia volta.
Faço uma refeição meia boca.
Pago meia no cinema.
Me arrumo em meia hora.
Compro meia dúzia de tomates.
Minhas disciplinas duram meio ano.
Meu salário vem no meio do mês.
Almoço ao meio dia.
Meus remédios tem meia-vida.
Minha cabeça é meio louca...

E tenho meia paciência pra algumas coisas.
Se é pra gostar de mim, se é pra ficar comigo...
Então vai gostar por inteiro e ficar direito.

Já tem muita coisa pela metade na vida.

Gabr.